segunda-feira, 30 de junho de 2008

Doze moradas de silêncio

hoje é dia de coisas simples
(Ai de mim! Que desgraça!
O creme de terra não voltará a aparecer!)
coisas simples como ir contigo ao restaurante
ler o horóscopo e os pequenos escândalos
folhear revistas pornográficas e
demorarmo-nos dentro da banheira
na ladeia pouco há a fazer
falaremos do tempo com os olhos presos dentro das
chávenas inventaremos palavras cruzadas na areia... jogos
e murmúrios de dedos por baixo da mesa
beberemos café
sorriremos à pessoas e às coisas
caminharemos lado a lado os ombros tocando-se
(se estivesses aqui!)
em silêncio olharíamos a foz do rio
é o brincar agitado do sol nas mãos das crianças
descalças
hoje



Al Berto

Dizem que a paixão o conheceu

dizem que a paixão o conheceu
mas hoje vive escondido nuns óculos escuros
senta-se no estremecer da noite enumera
o que lhe sobejou do adolescente rosto
turvo pela ligeira náusea da velhice

conhece a solidão de quem permanece acordado
quase sempre estendido ao lado do sono
pressente o suave esvoaçar da idade
ergue-se para o espelho
que lhe devolve um sorriso tamanho do medo

dizem que vive na transparência do sonho
à beira-mar envelheceu vagarosamente
sem que nenhuma ternura nenhuma alegria
nunhum ofício cantante
o tenha convencido a permanecer entre os vivos


Al Berto

E ao anoitecer

...e ao anoitecer adquires nome de ilha ou de vulcão
deixas viver sobre a pele uma criança de lume
e na fria lava da noite ensinas ao corpo
a paciência o amor o abandono das palavras
o silêncio e a difícil arte da melancolia...



Al Berto

A Aranha

A ARANHA do meu destino
Faz teias de eu não pensar.
Não soube o que era em menino,
Sou adulto sem o achar.
É que a teia, de espalhada
Apanhou-me o querer ir...
Sou uma vida baloiçada
Na consciência de existir.
A aranha da minha sorte
Faz teia de muro a muro...
Sou presa do meu suporte.




Fernando Pessoa

domingo, 29 de junho de 2008

Pensamento do dia....

'Quando a última árvore tiver caído,
Quando o último rio tiver secado,
Quando o último peixe for pescado,
Vocês vão entender que dinheiro não se come'.




(Greenpeace)

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Sombra móvel

SOMBRA MÓVEL
CÉGO IBRIDO DO AMOR
ENVOLVE O TEU SEIO AO BEIJO
NA SINFONIA DA NOITE
AMO-TE
E TODAS AS LINGUAS MORDEM POR TI
EU SEI
SEM DESCOBRIR O QUE SOU
QUE ALGO PASSA
E ME DESPE PARA MAIS
MORRO
HOJE
PERDIDO NA PAGINA DE UM ÊXTASE
ONDE SERÁS GUIADA
PELOS GRITOS
QUE SEGREDA-MOS Á LUA




Nimbus

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Bacanal de almas

CORPOS SUFUCADOS
NESTE BACANAL DE ALMAS




A BRIGA COMEÇOU




OS SEIOS ANSEIAM
PELA VIRTUOSA MÃO
DO PECADOR
UMA LENDA FAMINTA
ESCONDE-SE EM TUA CASA



NÃO CHORES
HOJE PARECIA-MOS UM GRUPO
DE REBELDES
A SABORIAR PASMOS
NA NAUSEA DA NOITE



Nimbus

Estranho sábio

OS ESPÉCTADORES
ABANDONAM O ANFITEATRO
ANTES DO ESTRANHO SÁBIO
FAZER A SUA ACTUAÇÃO
ABANDONAM-NO
PORQUE ELE SABE OS SEUS SEGREDOS
O ESTRANHO SÁBIO
MÉTE-LHES MEDO
ELE ATERRORIZA-OS
COM A SIMPLES IDÉIA DA VERDADE



Nimbus
(uma das primeiras)

conto lendas

e no leito de uma noite
conto lendas
de uma vitória nossa
extinguida no tempo
onde vencemos
a fúria de um feitiço
o segredo da água
o rebelde grito do vento
que nos guiava
sobre o cume quente dos corpos
mergulhados na agitação de um sonho
que de repente se dissipou
no acordar de uma manhã
vendida ao esquecimento
condenada á imensidão
de um simples olhar….



Nimbus

TENS DE ENFRENTAR

tens de enfrentar
a tua vida
que está a passar sorrateiramente
por ti
como uma serpente
enrolada em êxtase

baba de caracol

tens de enfrentar o inevitável
no fim de contas
Ossos Sangrentos apanhou-te



Jim Morrison
Titulo original: You Most Confront

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Pensamento do dia

Hoje, sei que se me entregasse seria imortal....
Imortal sem receios de ti....... e todos........
Detentora de um poder subrenatural........
Me deixaria levar, ao som da tua respiração

Atreve-te

Rir é correr risco de parecer tolo.

Chorar é correr o risco de parecer sentimental.

Estender a mão é correr o risco de se envolver.

Expor seus sentimentos é correr o risco de mostrar seu verdadeiro eu.

Defender seus sonhos e idéias diante da multidão é correr o risco de perder as pessoas.

Amar é correr o risco de não ser correspondido.

Viver é correr o risco de morrer. Confiar é correr o risco de se decepcionar.

Tentar é correr o risco de fracassar.

Mas os riscos devem ser corridos, porque o maior perigo é não arriscar nada. Há pessoas que não correm nenhum risco, não fazem nada, não têm nada e não são nada.

Elas podem até evitar sofrimentos e desilusões, mas elas não conseguem nada, não sentem nada, não mudam, não crescem, não amam, não vivem.

Acorrentadas por suas atitudes, elas viram escravas, privam-se de sua liberdade.

Somente a pessoa que corre riscos é livre!


Venus

para ti

para ti te escrevo,
estas simples palavras,
meu amigo, meu anjo da guarda,
tu que me devolveste o sol, a vida...
sim é para ti...
mas onde tu vês amizade,
eu vejo amor...
tímido mas muito verdadeiro
porque o que fica entre linhas
o meu corpo deseja...
mas nesta paixão reprimida
fica o sonho
que um dia possamos
jurar amor eterno,
onde a lua é a nossa única testemunha.
e nas estrelas gravamos os nossos nomes
para que sejamos recordados
como a bela e o monstro...
que se amam loucamente

desencontros da vida

sinto-me sem chão
sem ar para respirar
sem nada nas mãos
no meio do mar
onde as incertezas
trazem mais dor
a este coração
que tantas vezes foi magoado
mas nunca para de bater
na esperança de um dia
encontrar a solução
do seu bater...
preciso de lutar
nesta maré furiosa
que se chama vida.
tenho medo de viver,
tenho medo do que acredito,
mas não quero deixar de viver,
sem antes te poder dizer...
amor, meu grande amor...
és, foste e serás sempre o meu e
único amor!
mas a vida não me deu a oportunidade
e caí nesta imensidão de dor,
de incertezas e de tristeza.
onde morri sem te ver,
mas um dia meu amor,
saberás a verdade e aí...
quem sabe ...

terça-feira, 24 de junho de 2008

Grito mudo...

Estou só....
e acho que me vou perder
e deixar-me levar
pela chama de um outro fogo,
que chama por mim e me deseja.....
mas o teu doçe sal
permaneçe em mim
como um grito mudo
que só eu pareço ouvir.....




Nimbus

Solidão...

....e entrego-me
no desespero de uma vida
fundida na vastidão do sol
onde percorro as ruas
em busca de saudade
á muito perdida
e onde a noite
é camuflagem
de um mundo
que morre dentro de mim........
eu não quero tudo
quero-te nua
entre uma nova manhã
onde viverei o sonho
que trago na alma.......



Nimbus

Nem rei nem senhor...

Não sou
rei nem senhor
de tuas terras longinquas
que se arrastam aqui presas no teu olhar
nem ladrão
que foge
levando o cálice de tuas águas
que nos lançaram na seda doçe de uma noite
sou o lapso de um beijo
perdido nas estrelas
que aqui vençe o impossivel
e relembra felicidade.....



Nimbus

Só...

Pior que a solidão
o vazio
que desce sobre mim
disfarçado de saudade
Vertendo o medo
nas colinas da paixão
que secam com o Sol da demência
e vibram com o futuro da incerteza,
Eu sei,
Que não me fiz ouvir,
nem que tu te quisestes dar,
mas o sonho foi prolongado demais,
não sei,
que sou,
fui,
ou serei..........

.....longe de ti......



Nimbus

Chove....




CHOVE
MORRE POR AQUI O VERÃO
É HORA DE IBERNAR
E PEDIR-TE QUE FIQUES
A FELINA OLHA-ME
RUGE
CORRE
A NEVE QUE EMBRIAGA OS CAMPOS
É A SEDA ONDE GOSTA
DE SER POSSUIDA



Nimbus

Amigo...

E DE REPENTE...



UMA VAGA CRISTALINA
SEMENTE DE ANSIA
LEVAR-TE-A DAQUI

AMIGO


PARA O COME DE UMA MONTANHA
DE JOELHOS
SOBRE
AS TUAS VESTES HUMIDAS
SUPLICANDO O RASTO DA CARAVANA


Nimbus

E quando um Anjo....

E QUANDO UM ANJO
IMPONENTE & BRANCO
SUPLICAR
PELA TUA ALMA
DIZ-LHE QUE AQUELA MULHER
VESTIDA DE FOGO
É PAIXÃO
É FUGA NUM CAVALO SELVAGEM
DIZ-LHE
QUE AS SUAS ASAS CEDERÃO
PERANTE A TERRA
OS VENTOS
AS AGUAS
OS FOGOS
QUE LHE MOSTRAREMOS

O MONSTRO OLHA-NOS
CHORA
E ABANDONA A PLANICIE
COMO SE LHE TIVESSE-MOS
RECORDADO ALGUEM


Nimbus

E sem me esforçar...

E SEM ME ESFORÇAR
REPARO QUE ME ENCONTRO SÓ
APERTADO NO ESCURO DO FRIO
E NO MEU QUARTO
DEITADA COMIGO
ABRAÇO-TE
PERDIDO NO DESEJO
DE UMA MIRAGEM
QUE ESCORREGA COMO AGUA
NAS MÃOS DA SEDE

ORQUIDIA AZUL
VENTRE
BUNKER DE SAL
PERSEGUIDO
POR CÃES FAMINTOS EM FLOR
QUE DESPERTAM Á TUA PASSAGEM
HOJE
QUE TODOS ESQUEÇERAM
QUE NÃO DORMIA-MOS
HOJE
QUE TODOS ESQUEÇERAM
QUE SERIA-MOS MORTÁIS
PERANTE O BÁFO MITICO DA FÉ
CHEGUEI
RUDE
DE JOELHOS
SUPLICANDO A TUA AURA DE LEITE
QUE REPOUSA SOBRE O CIMO QUENTE
DA CIDADE.
ROUBÁRTE-EI O MEDO
QUE PAIRA NU
NA CHAMA VERTIGINOSA DO OLHAR
AMO-TE
E SEREI O RITMO LEVE
DA CHUVA
A TRESPASSAR-TE...


Nimbus

Sobre a Noite...

E SOBRE A NOITE QUE SE ME IMPÕE
NEGO-ME A ACEITAR
QUE A LUA PARA TI É OUTRA
PINTURA
QUE ESCORREGA NO CÉU
COMO UMA LÁGRIMA DEMENTE
TRÉMULA
SOBRE A FACE NEGRA
QUE DESPONTA DAS ÁGUAS
QUE ME TOMA NOS BRAÇOS
E ME BEIJA
ENTRE A SEDA DA CAMA
E A CARNE CRUA
BRANCA DA LUA

E SÓ
O SOL & A LUA
TESTEMUNHAS LUCIDAS
DA VERDADE
SABEM QUE O BEIJO
FOI O PRINCIPIO
PRINCIPIO DA MORTE
QUE SE APROXIMOU
DE MIM
COMO UM ESTRANHO SER
EMBRIAGADO
E ME RECORDOU
QUE TU EXISTIAS
PARA SEMPRE



Nimbus

Vida que desce...

VIDA QUE DESCE
Á TERRA
COMO UM ANJO
QUE ME TOMA
ME DESPE
E ME SAQUEIA
LEVANDO-ME NOVAMENTE
COMO UMA CRIANÇA
EU SEREI A ÁGUA
O SANGUE
QUE REBENTA DE TI
COMO A LUZ DO NOVO DIA
QUE DESCARADAMENTE
ATROPÉLA A NOITE
E SUGA O DESEJO
Á SERPENTE
QUE SE APROXIMA
E ME MORDE
E ME SEGREDA...



...FELICIDADE.


Nimbus

Gosto de ti...

GOSTO DE TI
PELO CHEIRO QUE TE NAVEGA NA PELE
PELO RITMO DO SOL
QUE TE PERNOITA NOS OLHOS
PORQUE A AURA
QUENTE
QUE TE ABRAÇA
É SEDE
QUE ME ENFUREÇE AS VEIAS
VIAJO NO SOPRO
DA NOITE
E LARGADO AQUI
SOBRE AS FLORES DO ESQUECIMENTO
PEÇO-TE QUE FIQUES
NUA
SOBRE A BRIGA DA CAMA
PREDADORA DO SONO
SUAVE
QUE ME VENCE
E ME ATIRA NO CHÃO
DEPOIS DO GRITO QUE SE TE SOLTA
DE DENTRO
VIVO
AQUI E ALI
NOS BRAÇOS DO PACTO
QUE NOS DESFAZ
SE EU SOUBESSE
QUE AS TUAS MÃOS
ABRIAM CHÁGAS
SE EU SOUBESSE
QUE NAS GARRAS
DO TEU SORRISO
IRIA SER FUZILÁDO
TER-ME-IA ENTREGADO
ANTES DO NASCER DO SOL
ANTES QUE O AR
ME EXCITÁ-SE
E ME DEPOSITÁ-SE
NO SÁL DE UM SONHO


Nimbus

Desta canção que apeteço...

Desta canção que apeteço
à espera do Maio ido
chega-me agora um trinado
do outro lado do rio


Quisera ser rio ou ave
cair no chão que estremeço
para cantar à vontade
esta canção que apeteço

Esta canção a meu gosto
vinda pela madrugada
sai da garganta da gente
aos magotes pela estrada.


Escrito na prisão de Caxias, 16 de Maio de 1973
Autor: José Afonso